sábado, 18 de outubro de 2008

Ultimo dia no Peru - Petroaudios e corrupcao; pobreza e consumismo

Neste meu ultimo dia no Peru, resolvi passear e passear, tentando resgatar o que levo deste pais. Primeiro de tudo, levo ja dois livros que comprei ontem: a obra prima de Edoardo Galeano, "As veias abertas da America Latina", livro polemico que transcorre toda a historia de saqueio do continente; e "Um pobre sentado sobre uma mina de ouro", sobre a ma gestao dos recursos naturais no Peru. Levo tambem a vontade de estudar os (nao) direitos dos indigenas.
Enquanto aqui estive, o Peru entrou numa grave crise politica. A crise dos Petroaudios. O governo de direita caiu e foi substituido por uma coligacao, encabecada por um politico de esquerda. Ao que parece, foram divulgadas escutas telefonicas ninguem sabe por quem, nas quais membros do governo demonstravam estar envolvidos num esquema de corrupcao relacionado com concessoes de exploracao de pocos de petroleo. Ficou provado que a empresa multinacional Discover Petroleum foi beneficiada em 5 dos concursos. E disto tenho um par de coisas a apontar. Primeira e que a empresa se declarou nao participante e nao ciente de tal esquema de corrupcao. Ora a mim parece-me obvio que se existem politicos corruptos e porque alguem ou alguma empresa os corrompe. Quanto a incognita de quem efectuou as escutas telefonicas e segundo as hipoteses dadas pela imprensa, penso que se foram outros membros da Assembleia que as efectuaram, nao me parece que tenha sido por bom samaritanismo ou amor a democracia, mas porque se sentiram defraudados por saberem o que se passava e nao ganharem nada com isso. Como uma especie de dor de cotovelo. Ou pode ser tambem que tudo isto saiu a luz agora porque o pais enfrenta uma grave recessao, que se preve agravar com a crise financeira internacional, e antes que as coisas fiquem piores, esta foi uma estrategia da direita para retirar o seu governo e colocar uma coligacao, liderada por um socialista de esquerda, que levara depois com as culpas da ma situacao do pais, e preparando assim uma nova vitoria da direita nas proximas eleicoes. Mas ja entrei demasiado na teoria da conspiracao para o que era suposto. Outra hipotese e talvez a mais provavel e a de que seja a empresa petroleira rival, Petrotech, quem entregou os Petroaudios a imprensa. Ate porque o advogado de dita empresa e casado com a jornalista que publicou a informacao, mas que nunca revelou quem lhe havia entregue as gravacoes. De qualquer forma, esta historia cheira a esturro por todos os lados.


Sentada num cafe e olhando um homem com um pano e um balde de agua na mao para lavar carros, comecei a ficar angustiada. Este homem, provavelmente com uma familia a qual tem de sustentar, esperando com um ar triste e honrado os poucos pesos que podera levar para casa hoje. E aqui a maior parte vive assim: esperando levar alguns pesos para casa. E subitamente penso em nos. No nosso egoismo cego. Que mentes perversas montaram o esquema em que se encontra o mundo agora. Quem conseguiu que nos transformassemos em zombies apenas preocupados em adquirir e possuir, sem nunca parar e reflectir. Porque para que nos tenhamos sempre mais e mais, e necessario que outros nao tenham nada. Nao tanto a logica do nao ha tudo para todos, mas mais a do sobe de um lado e desce do outro. Preocupamo-nos tanto com o facto de ter dinheiro e de ser cada vez mais ricos, mas basta pensar que so o facto de ter roupa e sapatos, poder comer varias refeicoes por dia, poder estudar e frequentar a Universidade, faria de nos milionarios em qualquer outro continente que nao seja Europa e America do Norte. Alem disto, tudo o resto e superfluo. Precisamos mesmo de armarios cheios de roupa? Eu ando aqui com tao poucas pecas e vejo que sao mais do que suficientes...
Talvez se pensarmos que os nossos actos tem realmente consequencias, as coisas mudem.


Preparo-me agora para uma viagem de autocarro de dois dias ate Santiago do Chile... Ate segunda!

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

O Moinho de Sabandia, as Sandálias Mágicas e os Cabelos ao Vento

Hoje fiz uma proeza inédita. Algo nunca antes tentado. Surgiu com a convergência de três factores determinantes: umas sandálias mágicas, um trauma relativamente a transportes públicos peruanos e a minha grande teimosia.

Mas comecemos pelo princípio. Um dia na Cidade do México, vi um índio mexicano que fabricava sandálias no meio da praça. Aproximei-me e constatei que eram umas sandálias bem giras! E como sou louca por coisas bem giras, resolvi prová-las, mas achei que nao seriam lá muito confortáveis. Perguntei ao velho índio que me garantiu que sim, que eram. Eu acreditei. Ele com toda a sua sabedoria lá devia saber...

E hoje foi comprovado. O velho índio fez-me umas sandálias mágicas. Com elas consegui caminhar 12 km seguidos desde o meu hotel até ao moinho de Sabandia. Mais ou menos a distância Cascais-Oeiras.

Caminhei e caminhei durante 2 horas e meia sob um sol escaldante (ganhei um belo bronze, juntamente com a horinha na piscina de manha...), teimando que nao entraria em nenhum autocarro, pelo menos hoje. E os meus ricos pezinhos chegaram frescos e novos, como se nada fosse. Provavelmente a melhor compra do ano! Com estas sandálias nos pés, sinto-me capaz de ir a qualquer lado. Sao o meu novo talisma. Sinto-me uma espécie de Apolo com asinhas nos pés!

E, como hoje é sem dúvida o meu dia (porque há certas chamadas telefónicas que nos poem "on top of the world"), quando finalmente cheguei ao moinho, avistei vários cavalos. Imediatamente fui abordada por um senhor que perguntou se eu queria montar. Ora Filipa em grego significa amiga dos cavalos (Philos Hippos) e o meu grande sonho é ter um dia um cavalo só meu. Claro está que aceitei sem pensar duas vezes e estive durante meia hora a galopar com os cabelos ao vento pelos campos e ao longo de um riacho que ali havia. Fiquei encharcada, mas soube-me pela vida!

O moinho de Sabandia é um antigo moinho (perdoem-me a redundância), construído em 1785, mas que estava em ruínas. Foi reconstruído agora para visitas turísticas. É absolutamente delicioso, no meio de pastos e campos verdes e com uma vista sobre Arequipa e os vulcoes Misti e Chachani alucinante.

As Sandálias Mágicas (peço desculpa pelos pés feios, mas o dedo torto é defeito de família...)


A meio caminho - o vulcao Misti e do lado direito Arequipa


A estrada do Moinho


Os cavalos


O moinho


quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Dia de cao...

Pois é... para todos aqueles que pensam que viajar é pêra doce, posso dizer que às vezes nao é bem assim. E o único culpado é o guia de viagem, que falhou em explicar bem as coisas.

Éis o que aconteceu: hoje saí do hotel às 9 da manha, para ir visitar o famoso desfiladeiro do Colca, o segundo maior do mundo, que fica aproximadamente a 100 km de Arequipa. Normalmente os turistas vao a este local através de agências de viagens, com um itinerário programado e estupidamente caro para o que é suposto. Entao, como garota independente que sou, resolvi procurar no guia a forma mais simples de ir até lá. E encontrei o que eu achava que iria resultar. Apanhando um autocarro até Chivay que, segundo o guia, fica "à entrada do desfiladeiro", e voltando no mesmo dia ainda. Peguei no gato, na máquina fotográfica, na câmara de filmar e num casaquito só na hipótese de ter um pouco de frio ao final da tarde e lá fui eu. Só consegui apanhar o autocarro às 11:30 e vim durante três horas ao lado de um peruano que silvou durante todo o caminho. Repito, silvou e nao assobiou. Nem sequer era um assobio. Quando finalmente cheguei a Chivay, às 3 da tarde e com os ouvidos em água, resolvi almoçar num restaurante na praça central. Basicamente Chivay é a cidade mais poeirenta que já vi na vida. Nenhuma rua está alcatroada e, para minha grande sorte estava um ventaval como nunca vi. Além do frio claro! Almoçando e falando com o empregado sobre o vento e tal, descobri que afinal o Desfiladeiro ainda fica a 2 horas de carro daqui. Ou seja, que nao tenho tempo de lá ir e voltar para apanhar o autocarro das 18:30 de volta a Arequipa... Segundo o guia o que era já aqui, afinal ainda fica bem longito...
Resultado, já parou o vento mas começou a chover, está um frio de rachar, eu só tenho um casaquito de algodao e tudo isto nao está ajudar nada à minha constipaçao, que já dura há alguns dias e hoje já estava a melhorar. A aldeia é só pó, nao há nada para ver e aqui estou eu a fazer tempo num sítio abrigado e a desabafar as minhas desgraças...
Ninguém disse que a vida era fácil...

..............

E passadas 6 horas, finalmente cheguei ao hotel. Pois e... O azar quando vem nao e as pinguinhas, mas sim aos jorros. O autocarro, que deveria demorar 3 horas a ca chegar, demorou 6! Viemos a 20 km/hora, parando a cada 500 metros porque a maquina aquecia demasiado... Desesperante... Alem de que vim o caminho todo sem poder reclinar o banco, porque o individuo que estava atras de mim ia com os joelhos enfiados nas minhas costas. Mal entramos em Arequipa sai do autocarro e apanhei um taxi como solucao final.

E agora vou dormir antes que me depare com mais uma situacao dificil. }
Deve ser da lua cheia com certeza...

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Juanita, a Princesa do Gelo

Aqui sim! Arequipa








Mais 10 horas de autocarro e cheguei a Arequipa, a cidade branca. Chamam-na assim devido à utilizaçao de uma rocha vulcânica branca na construçao dos edifícios coloniais. A cidade está a 2350m de altitude, sob um sol abrasador, numa regiao de vulcoes e canyons (nao sei como se diz em português...). Na Praça de Armas, por detrás da Catedral vislumbra-se o imponente vulcao Misti, ladeado pelo Chachani e pelo Pichu Pichu. É uma visao incrível. Além disso, a própria cidade, os edifícios com um máximo de três andares, as ruas empedradas, é uma autêntica delícia.
O próprio hotel, que escolhi só porque adorei o nome (La Casa de mi Abuela) é um encanto, cheio de jardinzinhos e recantos, e em todo lado canários cantando dentro de gaiolas penduradas em árvores... Como se estivesse no paraíso... Muy a gustito!
Comecei por passear até à Praça de Armas, para me situar e começar a ambientar à zona. Logo subi e atravessei o rio numa odisseia louca para chegar ao único restaurante de sushi da cidade. Lá consegui e valeu bem a pena. Com certeza voltarei. Depois, de barriga cheia, voltei a descer para ir ao Museu Santuários Andinos, da Universidade Católica de Santa Maria, ver a famosa Juanita. Para quem nao sabe, Juanita é a múmia de uma menina inca de 12 a 14 anos, sacrificada no cimo do vulcao Ampato há cerca de 550 anos. Juanita, a Princesa do Gelo. O seu óptimo estado de conservaçao exponenciou (usei a palavra!) um sem fim de investigaçoes científicas e antropológicas sobre a civilizaçao Inca.
Na altura em que foi sacrificada, os vulcoes da zona estavam em grande actividade. Os Incas consideravam as montanhas e os vulcoes como deuses, há que sublinhar. Entao o Grande Inca enviou quatro mensageiros a Arequipa para trazer a menina escolhida a Cuzco e iniciar assim a cerimónia do sacrifício. Juanita era uma menina nobre, muito saudável e bonita que, desde o seu nascimento, sabia que este seria o seu papel na sociedade. Viajou com os mais ilustres nobres e feiticeiros a Cuzco (cerca de 300 km), foi abençoada pelo Grande Inca e regressou para subir ao Ampato (6380 m de altitude), onde foi sacrificada com um golpe na cabeça, depois de anestesiada com chicha (bebida fermentada de milho, que nesta ocasiao chegava a conter 60º de álcool).
No museu estao expostos todos os artefactos que a acompanhavam e a sua minuciosidade é assombrosa.
Juanita foi descoberta em 1995 por Jhan Reinhard que, explorando o cimo do vulcao, avistou uma série de objectos incas, naquilo que parecia uma tumba, mas sem múmia no seu interior. Continuando a procurar, encontrou Juanita 60 metros abaixo, dentro da cratera do vulcao e coberta de gelo, pois a tumba desfez-se devido à actividade vulcânica.
Nao deixaram tirar fotografias como é lógico, mas foi algo que nunca esquecerei.
Regressei depois ao hotel, caminhando aleatoriamente pelas ruas e estou apaixonada por esta cidade. Tem algo da beleza de Portugal, de Lisboa, de Évora, mas é ainda melhor, mais bonita. Por enquanto, Arequipa vai em número um!

domingo, 12 de outubro de 2008

Algumas imagens de Nazca

Adoro o pormenor "solo"

Esquina da Praça de Armas
Three is a crowd
Graffiti queimado do sol
Mercado ao domingo Já estou quase uma expert a jogar bilhar, mas ainda nao me atrevi a entrar ali sozinha...

Inka Cola ou Capitalismo Ocidental



Hoje vou falar sobre uma bebida peruana, de seu nome Inka Cola. A Inka Cola, uma bebida gaseificada, de cor amarelo rebuçado, é feita a partir do aroma de uma planta peruana chamada Erva Luísa.

Ora bem, a Inka Cola sempre superou em vendas a Coca Cola no seu país de origem, o Perú. Como sendo uma bebida clara e mais leve que a sua principal concorrente, combina perfeitamente com os pratos condimentados peruanos.

Ontém, ao jantar numa pizzaria aqui em Nazca, resolvi perguntar ao dono algo sobre a Inka Cola. Ele respondeu-me que era a mais importante típica bebida sem álcool no Perú, feita da tal erva, e, quando eu lhe perguntei por que fazia parte da Coca Cola Company, ele respondeu que há poucos anos a Coca Cola tinha comprado dita marca.

Pois dita informaçao lá me comunicou com o sistema nervoso e resolvi investigar. Éis o que se afirma na Wikipedia:

"Este largo liderazgo en el mercado peruano causó que, en 1999, Coca Cola adquiriera, por 300 millones de dólares, el 60% de las acciones de la Inca Kola. Como parte del acuerdo de compra, la Corporación Lindley obtuvo el derecho de embotellar Coca-Cola y las marcas afines (Fanta, Sprite, etc) en el Perú. La transnacional estadounidense obtuvo, por otro lado, la propiedad de la marca para su producción y comercialización fuera del país manteniendo Lindley la propiedad de la misma en el Perú."

Que vos parece? É justo que uma marca bem sucedida num dos países da América do Sul, seja abruptamente engolida pela maior multinacional de bebidas nao alcoólicas? E atençao ao interesse da Coca Cola, deixaram a comercializaçao no Perú a cabo da companhia peruana apenas como "pequeno presentito", porque a ideia geral é exportar a bebida para os países asiáticos, onde a alimentaçao é parecida, em termos de condimentos e sabores, e a Inka Cola terá seguramente bastante sucesso.

Isto para nao falar de grande parte das marcas de água na América do Sul, que pertencem já também à Coca Cola Company...

E um dia. se é que já nao chegámos a esse dia (eu sinceramente penso que sim), a Coca Cola e outras multinacionais semelhantes dominarao o mundo...