sábado, 8 de novembro de 2008

Ultimo dia na Ilha da Pascoa e um pequeno presente para as minhas amigas

07.11.2008

Chegou o dia da partida. And now for something completely different: Australia. Vou passar 25 horas entre avioes e aeroportos ate chegar ao meu destino. E o dia 8 de Novembro literalmente nao vai existir no meu calendario. Entre o Chile e a Australia vai ser uma especie de regresso ao futuro.

Ontem a noite aproveitei para assistir ao espectaculo de danca de Rapa Nui, na companhia das duas amigas catalanas. O som, as cores, os gritos e os saltos tornaram-no numa experiencia inesquecivel. Ate porque ainda dei por mim no palco a tentar mexer a bunda, sem qualquer tipo de exito. Alem de que, ca entre nos, os homens de Rapa nui sao umas belas brasas. Assim que, especialmente para a minha querida amiga Mariazinha, ja tenho provas fotograficas da beleza exotica destas gentes. Em roupas tradicionais e tudo! Por isso aqui vai um filmezinho que fiz dos bailes para que todas as minhas amigas alegrem o seu dia!

Parto hoje com a promessa de voltar em 2010 para o eclipse solar. Ate breve Rapa Nui!




quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Rapa Nui

01.11.2008

Afinal o paraíso existe, e é na Ilha da Páscoa. Extremamente difícil de colocar em palavras, mas vou tentar. Em apenas um dia e meio já foram tantas emoçoes, que tenho de organizar o meu pensamento.

Comecemos pelo início. Aterrei ontém ao meio-dia nesta ilha paradisíaca, que fica a cerca de 2000 km de qualquer outro pedaço de terra habitado. Fui a pé do pequeno aeroporto até ao hostel (com malas e tudo, por isso imagine-se a distância). Os dois situam-se na única parte da ilha em que é possível construir algo, a cidade/aldeia de Hanga Roa. Tudo o resto é parque natural, cerca de 2/3 da ilha. Ao contrário do que eu pensava, como sendo esta a única parte habitável, apenas existem casinhas e cabanas e estao completamente inseridas na paisagem natural. Pelo menos uma vez na vida o Homem conseguiu nao estragar tudo com a sua presença e principalmente com o turismo. Parece que esta gente vive verdadeiramente no paraíso. Até os hotéis de luxo sao pequenas cabanas dispostas em círculo ou em rectângulo.


O meu hostel... está algures ali no meio!

O clima é polinésico, com uma média anual entre os 14º e os 28º. Ou seja, mesmo que esteja mau tempo, nunca está frio. Hoje choveu durante a tarde, mas o ar está quente. Resolvi alugar uma mota para conhecer a ilha. Tem cerca de 117 km2. A parte mais longa é de 24 km. Lá fui eu até ao outro lado da ilha, à praia de Anakena. O caminho por estrada atravessa campos cheios de cavalos selvagens e algum gado bovino. Na praia, fui recebida por 5 Moai sobre o seu Ahu na areia branca e rodeados de coqueiros. Paraíso... incrível! Uma sensaçao de calma e paz que nunca senti em outro lugar e penso que nao voltarei a sentir.

Daí fui até ao vulcao Rano Raraku, onde se fabricavam os Moai. Talhavam-se na rocha vulcânica, numa única peça e depois eram colocados na vertical (nao se sabe bem como) e desciam-nos (também nao se sabe bem como) pela encosta até aos seus Ahu (altares de pedra em frente ao mar). Nas encostas do Rano Raraku, dezenas de Moai parecem caminhar, descendo até aos seus altares.


Regressei pela costa sul da ilha, passando por incontáveis Ahu, com e sem Moai, até ao Hostel, porque começou a chover. Quando melhorou, e depois de uma bela sesta, peguei na mota e fui até à costa oeste, o local ideal para fazer surf, com ondas absolutamente perfeitas e intermináveis. Aí perto, numa gruta, Ana Kai Tangata, que era utilizada como lugar cerimonial de construçao de embarcaçoes, ainda se podem vislumbrar pinturas rupestres de pássaros no tecto.



Silly photo of the year... Felips Moai!



Espreguiço-me agora numa esplanada no meio de palmeiras, depois de um cigarro e de um café, e vou tentar resumir a história e a cultura deste local divino.

Segundo a lenda, os primeiros habitantes da ilha partiram de Marae Renga, uma ilha que provavelmente pertencia às Marquesas. Após ser derrotado pelo seu irmao, Ariki Hotu Matua teve de procurar um novo pedaço de terra no Pacífico. Para tal, enviou sete guerreiros em busca de uma ilha. Estes chegaram e escolheram a praia de Anakena como local para receber o rei e o seu povo. Hotu Matua viveu no vulcao Rano Kau até à sua morte, quando repartiu todo o território pelos seus filhos, que se tornaram nos antecessores das vários tribos de Rapa Nui. No séc. XVII, antes da chegada dos europeus, as várias tribos haviam já entrado em guerra por questoes territoriais e de recursos. Disto resultou uma fase de destruiçao dos Moai, que representavam a Mana (força interior) de cada tribo, e a quase extinçao do povo de Rapa Nui, nao só pela guerra sangrenta, mas também por canibalismo. Começou entao um novo culto na ilha, ao deus criador Makemake e ao Homem-Pássaro. Este último era o ganhador de um concurso em que o objectivo era nadar de Orongo até um dos ilhotes e recolher o primeiro ovo de pássaro da primavera, e o seu prémio era ser o chefe da ilha durante um ano.

Até que em 1722, o explorador holandês Jacob Roggeveen chegou à ilha, num domingo de Páscoa. Daí o nome pelo qual a ilha é conhecida até hoje.

Só muito mais tarde começou a haver interesse económico na ilha, exportando os seus poucos habitantes como escravos para o Tahiti, Peru e Austrália. Em 1870, o francês Dutroux-Bornier decidiu trazer ovelhas para Rapa Nui e transformar a ilha num rancho, mas entrou em conflicto com os missionários, que queriam enviar os escravos para os campos de trabalho fora da ilha. Entao expulsou os missionários da ilha, deixando-os levar os escravos para Tahiti, deixando apenas cerca de 100 habitantes na ilha. Finalmente, em 1877 foi assassinado pelos poucos nativos que ficaram.

Em 1888, depois da Guerra do Pacífico, o Chile anexou a Ilha da Páscoa ao seu território. Até hoje, o povo de Rapa Nui anseia pela sua independência, mas a dependência económica do Chile nao torna as coisas fáceis. Além disso, os nativos reclamam a devoluçao das terras que foram nomeadas Parque Natural. Toda esta zona de Parque é controlada pelo governo do Chile, e querem a sua devoluçao ao povo Rapa Nui ou pelo menos ter o controlo dos recursos para preservar o seu património.


De facto, os nativos mais se parecem aos polinésios e aos maori, do que aos chilenos. E a sua preocupaçao pelo meio ambiente é bem visível em Hanga Roa, o único local habitável e sob seu controlo. As ruas estao impecavelmente limpas, ao contrário de qualquer outro sítio que eu tenha visto na América do Sul.

Penso que devo também explicar um pouco sobre os Ahus e os Moais, visto que sao a atracçao principal da ilha. Existem cerca de 1000 Moai em Rapa Nui. A maioria representam bustos masculinos, embora uma escassa minoria se podem identificar como femininos. Simbolizam os primeiros habitantes da ilha, os antepassados de cada uma das tribos dos filhos de Hotu Matua, a sua importância na sociedade e a sua Mana. Eram talhados nos rochedos do vulcao Rano Raraku mediam entre 2 a 21 metros de altura! Os chamados Ahu eram os altares onde deviam ser colocadas as estátuas. Sao grandes plataformas de pedra junto ao mar que recebiam os Moai. Estes eram sempre posicionados de costas para o mar. Há mais ou menos 350 Ahu espalhados por toda a costa da Ilha da Páscoa. Os únicos Moai de pé foram restaurados, pois com as guerras tribais, terremotos e tsunamis, nenhum se encontrava na sua posiçao original. No Ahu Atura Huki por exemplo, foram necessárias doze pessoas e um jeep para por de pé o Moai solitário. Com a ajuda de troncos de madeira, pedras e cordas, levantaram a estátua ao fim de vinte dias. Permanece a dúvida de como os nativos realizavam, séculos atrás, esta tarefa herculiana.

E fico-me por aqui, com o desejo de que amanha esteja melhor tempo.


02.11.2008

Hoje decidi fazer o que os meus colegas viajantes chamam de trekking. Basicamente consiste em calçar umas botas todo-o-terreno e partir à aventura pelo meio da natureza. O destino eleito foi o vulcao Rano Kau e a mítica cidade de Orongo, onde se realizava a cerimónia do Homem-Pássaro. O Rano Kau fica no extremo sudoeste da ilha e é um dos três vulcoes de Rapa Nui. Há, porém, que salientar que aqui tudo o que seja indicaçoes, placas ou informaçao, brilha pela sua ausência. Logo, mesmo com um mapa na mao, uma pessoa só se safa pelo seu excelente sentido de orientaçao. Lá fui caminhando com a ajuda do mapa, mas eventualmente falhei uma saída num dos muitos trilhos, e dei por mim a subir e a subir, mas descrevendo uma larga curva nas encostas do vulcao. Ora eu nunca fiz trekking, mas para mim toda a ideia deste desporto é continuar e ver até onde vai dar. Andei e andei por trilhos de terra, no meio de florestas, de pastos e de rochedos. A certa altura, num estreito caminho ladeado por gigantescos e densos arbustos que nao deixavam ver nada, surgiu uma enorme vaca à minha frente. Parei subitamente. Ela parou também, ficando a olhar para mim com aquela cara que só as vacas sabem fazer. O seu tamanho, a sua cara e os seus cornos provocaram em mim uma leve sensaçao de medo. Impossível contorná-la, dada a largura do trilho. Ela continuava olhando-me impassível e ameaçadora e, enquanto eu media as minhas hipóteses, apareceu outra enorme vaca do nada. E ficaram as duas a olhar para mim como now what you're gonna do about it? Ok, duas já é demasiada vaca para a minha pequena estatura. Assim que resolvi voltar para trás, e enquanto o fazia, lá desapareceram as duas no meio dos arbustos de onde tinham brotado. Continuei entao o longo caminho, já a ver a minha vida a andar para trás, mas o trekking é andar para a frente. Depois de três horas a subir e sem saber bem onde estava, lá avistei finalmente a cratera do Rano Kau. E percebi a minha falha. A cratera fica junto ao mar e o seu extremo está em constante erosao, devido ao contacto com o mar. Em vez de estar no lado de Orongo, eu tinha tomado o caminho até ao lado oposto. Nao seria grave se a parte em erosao nao estivesse justamente ali. E obviamente a passagem estava vedada. Tive entao de contornar toda a cratera, o que me proporcionou vistas fantásticas, tanto do Rano Kau como de toda a ilha.



Dentro da cratera, que funciona como estufa, crescem milhares de espécies autóctones de plantas nas encostas, enquanto que o centro esta coberto de água e placas de vegetaçao, sobre as quais é possível caminhar. A meio do caminho inóspito, deparei-me com o que parecia uma tumba. Aproximei-me e vi que era uma placa que celebrava a descoberta da rapamicina em 1965, uma substância usada em transplantes de órgaos humanos.

Cheguei finalmente a Orongo, uma cidade cerimonial situada no cimo da cratera e em frente às duas pequenas ilhas onde chegava a pequena gaivota Manutara. Aqui celebrava-se o culto do Homem-Pássaro e é possível apreciar vários petróglifos que o ilustram. Existem 53 casas reconstruídas que lembram as construçoes incas do Machu Picchu. A única diferença é que todas têm uma forma circular ou oval, enquanto que as incas eram quadradas e rectangulares. Mas o cenário e a paisagem sao igualmente de tirar o fôlego. Ao descer, acertei finalmente no percurso e demorei cerca de 30 minutos a chegar a Hanga Roa. Ossos do ofício. Fazer trekking é mesmo isto.



03.11.2008

Vale a pena falar sobre os meios de transporte na Ilha da Páscoa. Visto que quase todas as estradas sao em terra batida, os veículos adequam-se a esta particularidade. As pessoas aqui circulam em jeep (normalmente Suzuki), em motas de cross (XT, DR e BW todo-o-terreno) e nas clássicas carrinhas Toyota de caixa aberta. Em relaçao às motas, há uma característica que devo salientar: a maior parte dos pascoenses conduzem as brutas motas de calçoes e descalços! E capacete é coisa que nao existe em toda a ilha.

Hoje resolvi ter mais uma aventura de trekking. Desta vez até ao Ahu Akivi, onde se encontram os únicos sete Moai que estao virados para o mar. Diz-se que representam os sete guerreiros enviados por Hotu Matua. O céu estava parcialmente nublado, o que convidava a um belo dia de passeio. Parti de Hanga Roa por um trilho que contorna toda a costa no sentido norte. O mar azul, a paisagem verde e montanhosa e os vários Ahu tornaram o caminho bastante prazenteiro. Vi também algumas cavernas mas, por falta de lanterna, nao me pude aventurar muito pelo seu interior. Quando cheguei ao Ahu Akivi, o céu tinha aberto completamente e o sol ardia na minha pele. A garrafa de água estava quase a terminar e ainda faltavam uns bons kilómetros até Hanga Roa. O sol abrasador tornou-se insuportável, tive de parar nas poucas sombras ao longo do caminho, até que finalmente surgiu uma Toyota de caixa aberta, deixando atrás de si um rasto de pó. Pedi para parar e perguntei ao condutor pasquense, que levava uma família de americanos em excursao, se me podia levar até à cidade. Fiz entao o resto do caminho na parte de trás da carrinha, apenas para constatar que, se tivesse continuado a pé, provavelmente morreria tostada pelo sol e desidratada. Mas, como eu digo, a sorte está sempre do lado do viajante.


De volta à cidade, e depois de descansar e recompor energias no hostel, fui até ao mercado de artesanato apreciar o que se faz por cá. Mas já me disseram que tudo o que se vende aí é feito na prisao de Hanga Roa, onde se pode ir e comprar as coisas a metade do preço.


05.11.2008

Parece que os Estados Unidos finalmente recuperaram o juízo! Pois é, aqui as notícias também chegam. E confesso que todos celebrámos aqui no Hostel, entre chilenos, espanhóis, americanos, suecos e a portuguesinha de serviço. Por incrível que pareça ainda nao me cruzei com um único português em toda a viagem, nem conheci ninguém que já tivesse avistado algum outro lusitano perdido pelo mundo.

E continuando as minhas peripécias por estas terras, ontém peguei novamente na mota e, depois de ter de regressar ao hostel devido a uma chuvada monumental, o céu abriu e fui até à praia de Anakena apanhar uns belos banhos de sol. Algo que constatei logo que seria impossível. O sol aqui arde na pele de uma forma insuportável, por isso a minha praia foi passada à sombra de um coqueiro.

Ao regressar, a minha nabice em relaçao a motociclos finalmente deu ares da sua graça e, ao tirar o descanso da mota que se encontrava ligeiramente inclinada, deixei-a cair levando consigo um pedaço da minha unha do pé. Primeira lesao da viagem, mas nada de grave. De volta a Hanga Roa, passei pelas lojas de souvenirs e comprei um pequeno livro de uma antropóloga chilena sobre a história da cultura Rapa Nui desde a perspectiva das pinturas corporais e das tatuagens, que tinham uma enorme importância para este povo.

Hoje fui a pé até à prisao/oficina de artesanato. Fica um pouco fora do centro e na longa estrada lá consegui arranjar uma boleiazita que me deixou à porta do estabelecimento. Aí, um guarda abriu o portao e dei por mim no pátio da prisao, onde vários presos talhavam em madeira figuras de Moai, do deus Makemake, bastoes cerimoniais, etc. Um ambiente super relaxado, nada a ideia que eu tenho de um prisao. Os presos muito simpaticamente me explicaram como fabricavam os artefactos e prontamente se puseram a tentar impingir-me tudo o que ali havia. Acabei por comprar umas quantas peças diminutas, visto que a minha viagem nao dá para mais, e ao preço da chuva. Nada comparado com o que tinha visto no mercado de artesanato. Mas estas coisas sao pequenos segredos que a maioria dos turistas nao chega a conhecer.

À tarde fui até ao pequeno museu sobre Rapa Nui, que está praticamente vazio de peças e é composto na sua maior parte de grandes placards que explicam a situaçao geográfica da ilha, a sua história e o pouco que se sabe desta cultura, visto que muito se perdeu com a chegada dos missionários. Aprendi também que existia uma espécie de escrita signográfica aqui, algo inédito em outras culturas polinésicas, e que nao tinha nenhuma correspondência com a linguagem oral. Só alguns iniciados neste conhecimento sabiam o significado de cada hieróglifo, mas o seu conhecimento perdeu-se para sempre com o envio destes homens como escravos para o Perú. É a chamada escrita Rongo Rongo que até hoje ninguém conseguiu decifrar.

Na pequena praia do porto de Hanga Roa, ao observar as ondas e os surfistas (como fui encarregada em trabalhos de casa), fui abordada por um turista que me perguntou se eu filmava tartarugas. Pensei que era alguma linguagem código ou qualquer coisa do género, até que ele me assinalou um sítio a poucos metros dali, onde estavam cerca de dez tartarugas marinhas enormes dentro de água. Tentei filmar, mas penso que as suas enormes cabeçonas verdes nao vao sobressair tanto num ecra como na vida real...




06.11.2008

Hoje passei toda a manha em grande filme no único banco da ilha a tentar levantar dinheiro. A abarrotar de gente no seu interior, porque no exterior nao é impossível levantar dinheiro com Visa. Parece que a Visa nao quis por um multibanco aqui, nao sei por que raio. Depois de horas à espera em várias e diversas filas, lá soube que o meu cartao nao funcionaria de qualquer maneira, porque é visa electron. A minha sorte foi que às tantas chegou uma espanhola, catalana perdao, que está no meu hostel e que amanha também voa para Santiago. Assim emprestou-me o dinheiro que me faltava e no aeroporto de Santiago já lhe posso pagar de volta.

E agora, estou há umas três horas a tentar publicar tudo isto no blog e a subir as fotografias, mas a net aqui além de ser cara é bastante lenta e estou prestes a deixar a coisa por aqui... Se virem poucas fotos, já sabem o que se passou...